segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

O caso da modelo desnuda

"Quem não gosta de samba, bom sujeito não é. É ruim da cabeça ou doente do pé".

A grande atração do desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro foi a modelo Viviane Castro, a qual desceu a avenida com o "menor tapa-sexo do mundo", ou, segundo outros, sem nenhum tapa-sexo.
A São Clemente, que trouxe Viviane, acabou em último lugar e foi rebaixada para a segunda divisão da elite do samba. Mas não foi, em absoluto, por causa da beldade. A "ousadia" de Viviane custou apenas meio ponto para a agremiação. Ou seja, ela cairia de qualquer jeito.
Agora, o que causou espécie foram os rompantes de alguns falsos moralistas que, de regulamento em punho, disseram tratar-se o ato da moça de algo não apenas proibido, mas obsceno, porque ela evoluíra na avenida com a genitália exposta, pintada ou decorada. Ora, mas o que mais se vê no carnaval, não apenas carioca, do país inteiro, são mulheres desnudas ou semi-desnudas, mas de uma nudez que, de modo algum, é imoral ou obsceno. O que chocava ontem, hoje não causa espanto. É uma nudez artística, que tem um enredo, uma história por trás. Uma nudez plástica, bela e, portanto, apreciável e tolerável pela moral reinante.
Li por aí que alguém cogitou de processá-la pelo crime do art. 233 do Código Penal, o qual estabelece: "Praticar ato obsceno em lugar público ou aberto ou exposto ao público. Pena: detenção, de três meses a um ano, ou multa". É muita falta do que fazer. A conduta da modelo não chegou nem perto do tipo penal. Primeiro, porque se cuida de uma festa onde a caracterização das passistas é essa mesmo. Segundo, porque ela representava, ainda por cima, uma personagem, uma índia. Terceiro, porque quem vai para a avenida ou assiste ao desfile pela televisão já está acostumado com coisas do gênero.
Basta ver que no julgamento do habeas corpus 839967, DJ 26.08.2005, p. 65, o Supremo Tribunal Federal (STF), considerou, vejam só, que o ato do diretor teatral Gerald Thomas de simular uma masturbação e mostrar o bumbum para as pessoas que o vaiavam no teatro municipal do Rio de Janeiro, refletia, embora de maneira deseducada, o seu direito de expressar-se em relação às críticas que recebia. O ministro Celso de Mello, que votou a favor de Thomas, disse que o ato obsceno, real ou simulado, deve ter um conotação sexual que transgrida o sentimento de decência da coletividade, e, mais do que isto, precisa ser visto no contexto em que que se encontra, pois o ato obsceno se trata de um conceito variável no tempo e no espaço. Sem isto, não há como configurar-se o delito.
Está mais do que claro, portanto, que o desfile de Viviane, passou bem longe de qualquer intenção sexual, mas representou apenas uma expressão de arte, perfeitamente inserida no espírito carnavalesco, o que lhe retira qualquer laivo de ilicitude. Com ou sem tapa-sexo.
Na verdade, no Brasil, as pessoas se escandalizam por pouca coisa. As grandes bandalheiras, como o mensalão, os cartões corporativos, o roubo, enfim, dos dinheiros públicos, já não causam nenhum efeito. As verdadeiras obscenidades, protagonizadas pelos nossos políticos, são escandalosa e infelizmente toleradas.

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