sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

O fim da Lei de Imprensa

"A liberdade, Sancho, é um dos mais preciosos dons que os céus deram aos homens; a ela não podem igualar-se os tesourosda terra nem do mar. Pela liberdade, assim como pela honra, se pode e se deve arriscar a vida".

A decisão do ministro Carlos Britto, referendada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF nº 130-7), que suspendeu inúmeros dispositivos da Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa), para quem é do ramo, não constitui uma grande novidade.
De fato, há muito que os tribunais do país já os vêm desconsiderando, ao argumento de que não foram recepcionados pela Constituição Federal (CF) de 1988, bem como pelas emendas que esta, ao longo do tempo, sofreu.
Por exemplo, ao suspender a eficácia da parte inicial do §2º do art. 1º do citado diploma legal, o STF nada mais fez do que reafirmar o preceito do §2º do art. 220 da CF, o qual proscreve a censura. Ao fazer o mesmo em relação aos artigos 3º, 4º, 5º e 6º da Lei 5.250/67, os quais impunham amplas restrições à participação de estrangeiros (pessoas físicas e jurídicas) em órgãos de comunicação nacionais, adapta à realidade imposta pelo art. 222 da CF, que permite, dentre outras coisas, a participação de 30% de capital estrangeiro nessas mesmas empresas, além de garantir a propriedade delas a estrangeiros naturalizados há mais de dez anos. De igual sorte, ao negar aplicabilidade aos artigos 51 e 52, bem como à parte final do art. 56, a decisão do STF, na verdade, confirma a jurisprudência majoritária no sentido de que não há, a priori, a não ser pelos condicionamentos dos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, para tarifação ou limites de valores decorrentes de responsabilidade civil de jornalistas e empresas de comunicação , bem como não vige mais o prazo de três (3) meses, sob pena de decadência, para ajuizamento de ação indenizatória. Agora o prazo é de três (3) anos, na forma do art. 206, V, do novo Código Civil. Outra discussão que chega ao fim, embora já superada também pelos tribunais é a que dizia respeito à necessidade de depositar-se, em delitos de imprensa, o valor da condenação para poder recorrer, circunstância que era prevista no §6º do art. 57 da Lei de Imprensa.
Aquelas previsões, igualmente, de proibição de circulação, de apreensão e até de destruição de jornais, inclusive pela polícia, foram definitivamente sepultadas, conquanto ainda estivessem por aí como almas penadas.
A Lei de Imprensa, criada no auge do regime de exceção constitucional no Brasil, não veio para regular o setor; veio para cercear a liberdade de pensar, de difundir idéias e opiniões; veio para calar e servir de instrumento de intimidação. Ela, portanto, essa espécie de Frankstein, já vai tarde. Já passava da hora de enterrar esse cadáver.
Agora, é preciso pensar com cuidado no que virá depois. Nada, porém, pode constituir embaraço à liberdade de informar, de pensar e de ser informado. Os abusos, é claro, devem ser punidos, mas, sob tal pretexto, não é possível esconder, por exemplo, a malfeitoria dos homens públicos, o que muitos têm pretendido com ações indenizatórias de danos morais contra órgãos de comunicação.
O efeito prático da decisão do STF é que todos os processos que cuidam do tema, especificamente que têm os dispositivos objeto da medida judicial, ficam suspensos até o julgamento do mérito da ADPF naquela Corte.

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